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JOAQUIM BENEDITO BARBOSA  

GILVANFREIRE2012Assustado com a suntuosidade do trono papal, ornamentado quase todo com ouro puro do melhor quilate, João XXIII (1881/ 1963) estarreceu-se ao sentar na majestosa cadeira destinada ao pontifice da Igreja Católica, logo que assumiu o cargo, no final dos anos 50 do século passado.

De fato, para que a vetusta Santa Igreja de Pedro estivesse nadando em ouro era preciso que ao longo dos tempos tivesse negado a Cristo, seu mártir inspirador, pois, como se sabe, o homenageado da religião nasceu numa mangedoura – um tabuleiro destinado a depósito de comida para vacas e cavalos nos estábulos, tambem chamada de cocho.

Não só por este motivo Angelo Giuseppe Roncalli indignou-se, mas também pelo fato de ele próprio ter nascido muito pobre, filho de pequenos lavradores de Sotto Il Monte, no interior da Itália.

Era mesmo de estranhar que uma Igreja surgida do voto do sacrificio e da pobreza, que teve em seus primórdios um berço de tão marcantes penúrias, pudesse ostentar o luxo, só comparável aos mais extravagantes impérios coloniais da História, inclusive àqueles que cercearam, seviciaram, silenciaram e assassinaram Jesus – em verdade o pai da Igreja Cristã.

Passado o curto pontificado de Angelo Roncalli (1958/ 1963), proclamado pela sua simplicidade e humildade ‘o Papa bom’, o luxo e o Vaticano continuaram os mesmos, muito embora a Igreja tenha feito a partir dele uma opção preferencial pelos pobres, um movimento reformador do clero que ajudou a melhorar a sorte política dos miseráveis na America Latina.

UM NEGRO POBRE NO STF

A chegada de Joaquim Barbosa na presidência do Supremo Tribunal Federal, no momento em que a mais alta côrte de justiça do Brasil arreganha suas vísceras para expor pela televisão os defeitos ocultos de seus membros muito mais do que as qualidades presumidas dos que ali sentam, é, de alguma forma, a reedição do episódio de João XXIII no trono papal.

Mesmo que Joaquim Benedito não possa ser considerado literalmente um ‘bom ministro’, no sentido de revelar com habitualidade um perfil de homem generoso, bondoso e humilde, traços humanos não muito frequentes entre as autoridades brancas ou negras dos grandes escalões da República, ele tem de comum com Angelo Roncalli um traço de identidade de origem: ambos são filhos de pais extramamente pobres, e chegaram ao topo de um poder onde imperam o luxo, a empáfia e a suntuosidade, mesmo que esses poderes sejam representativos de massas humanas predominantemente paupérrimas.

Já se sabe que tanto quanto o bom Papa João, Joaquim Benedito deplorou o luxo de um judiciário que não se abaixa para atender a pobreza do país, em nome da equidade, muito embora esse poder imperial e elitista seja o mesmo onde Joaquim tem assento há alguns anos em silêncio quanto a queixa que faz agora.

Resta saber o que o ministro negro, símbolo de uma raça raçuda e brava, fará no cargo para justificar o seu desabafo tardio, e o que será o país durante e depois de seu pontificado no Supremo. Mas, só em desabafar, já foi um pequeno ganho. O outro ganho é vim e ser – vim da pobreza e ser negro.

Fonte
Gilvan Freire

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